Estava sentado na beira da antiga rodoviária do Serro, como quem espera a próxima partida. Lançou-me os imensos olhos claros. Calçava luvas pretas. Numa das mãos, faltava um dedo, deixando uma porção de lã solta ao vento, que se mexia a cada movimento seu.
Luiz tinha pressa. Desejo por voltar logo a andar a pé pelo mundo. Diamantina, Serra do Cipó, Lagoa Santa. Do Serro a Belo Horizonte. Quase 200 léguas até Campina Verde.
Dormir? No mato.
Medo? De onça.
Assombração? Louco? Só andarilho.
Solitário e prestativo. Luiz foi rodoviária, carro, caminho, mensagem, encomenda, tropa, paragem, elo. Foi pureza. Bondade pelos outros apenas pelo prazer de andar.
Tristeza? Não ter ido andando até Vitória.
Sonho? Ir andando até Vitória.
Na despedida, lhe perguntei de onde tirou força para caminhar tanto. Ele arrumou a gola do paletó, passou a luva com o dedo falho para ajustá-lo, cravou os olhos radiantes em mim e sorriu. Orgulhoso, abaixou e respondeu, batendo a luva na perna: “essa aqui é a minha gasolina”.
Despediu-se e andando, partiu. Naquele instante, percebi o que queria ser na vida. Eu queria ser caminho. Só para um dia dizer a Luiz Paletó, “ajeita a perna, meu amigo, pois hoje vamos juntos até Vitória”.